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 30jun 

De minhas contradições

 

Texto: Ana Ribas Diefenthaeler

Fonte: A Notícia

Devo ser a única pessoa no universo que não gosta de festa junina. E não gosto mesmo, nem um pouquinho. Nesta época do ano, por missão de mãe e de avó, sou obrigada a participar de algumas. Vou pelo amor que me move a vida todos os dias, mas não pelo prazer do evento em si.

Não gosto das músicas – normalmente sertanejas, quase nunca o chamado forró pé de serra, original da festa que, para mim, só é autêntica quando assume as cores do norte/nordeste brasileiro. Forró tem que ter acordeão, zabumba e triângulo – e passear, majestoso, pelos ritmos mais tradicionais daquela região, como o xote e o baião.

Pedido o devido perdão a quem pensa diferente e gosta desses encontros estranhos, regados a vinho quente com cachaça e milhares de combinações de milho e seus derivados, não acho graça nenhuma em separar os cabelos e prendê-los em ridículas marias-chiquinhas, muito menos em exagerar na maquiagem e, ainda, inventar negras sardas sobre o rouge mais que evidente. Há até quem pinte um dos dentes da frente, para aparecer a “janelinha” que muito mais do que deixar engraçadinha a personagem, denuncia a falta das mais elementares condições de saúde a que estão relegados nossos verdadeiros caipiras.

Em suma, o que deveria homenagear, ridiculariza. O que deveria reverenciar, mostra um caipira brasileiro caricato, ri de seus valores e de suas verdades. Não sei muito bem como são as festas juninas na zona rural do Sul brasileiro – penso que sejam um pouco mais autênticas, mais raízes e menos pretensa urbanidade.

E, sim, há pessoas de meu convívio que não encontram razão em meus argumentos – dizem que não há mal algum em vestir uma camisa xadrez, se empanturrar de pinhão (eca!), que é a marca mais importante dos folguedos sulistas e me acusam de radical, já que, quando preciso ir a uma festa dessas, vou sempre de má-vontade.

Mas eu coloco nesta mesma panela a polêmica surgida em Joinville envolvendo o que se convencionou chamar de “blackface”. Primeiro, detesto a expressão em inglês, que deixa ainda mais pejorativa a cara preta. Segundo, que associo a personagem trazida para o Sul à figura dos bonecos nordestinos, os famosos mamulengos. Para o bem ou para o mal, os bonecos são de todas as cores, pura sátira, com belíssimos exemplares de negros e negras, que deram origem e inspiração a diversos outros artistas daquela região. São expressão, quase uma autocrítica, de uma cultura muito rica. Ou são aquilo que todos deveríamos ser e ver, de vez em quando – o avesso de nós.

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