Menu

Blog

 21set 

Nas curvas de Urubici

 

Texto: Ana Ribas Diefenthaeler

Fonte: A Notícia

Quero dizer que amo aquela deliciosa terra da gente mais gente que já pude compreender. Amo as paisagens montanhosas, o cheiro das araucárias imponentes, a fumaça das lareiras, o vinho colorindo a alma, a cachorrada linda, solta na vida.

Amo aquelas estradas sinuosas e as entranhas da terra, embranquecidas de um frio gostoso, que faz bater mais alto e forte o coração. Amo aqueles cascalhos em que não se pode caminhar de salto alto. Porque é ali a síntese exata da mais singela sofisticação do viver.

E, não há como não dizer, fiquei apaixonada pelas ruas bucólicas e as pessoas serenas, que passam por nós sorridentes, com a calma e a convicção de que a vida precisa ser degustada suavemente, como quem sorve o mate amargo em meio à prosa ou transcende ao sabor insistente, mas delicado, da truta. O tempo, ali, é mesmo relativo e abundante.

Devo gratidão a pessoas tão atenciosas como sutis, como o Enio, a Sandra, a minha tocaia Ana. E às artesãs da grande alquimia do sabor, Líria e Caciana, impecáveis anfitriãs de uma noite esplendorosa, entre risotos, vinhos e filés – com uma chuvinha alegre, para marcar o ritmo de um inegável prazer.

Lá eu vi a Pedra Furada segundos antes de ser engolida pela neblina. Vi a paisagem mais instigante e terna, ao redor do território escolhido por um lindo par de azulões, que cantava a poucos metros de nossa varanda. Dormi ao som inigualável de uma belíssima queda d´água – eu, que sou exigente com sons, que nasci meio música, meio verso. Despertei cedinho, notívaga que sempre fui, sob a bênção majestosa de indescritível sol.

E passeei entre montanhas, vales, desvãos.

Urubici, nome indígena que, para alguns é xokleng e significa pássaro brilhante, para outros é tupi e indica a “terra mãe da água gelada”, pode muito bem ser traduzida pelo cantinho mais paraíso da serra catarinense.

Lá eu vi, antes de tudo, a leveza de ser. A exuberância da natureza ofuscando a palavra e sendo, ela própria, o léxico de quem se permite enxergá-la assim, verde esperança de que tudo à nossa volta, afinal, algum dia, possa ser contaminado por tamanha luz.

Foram, então, tempos de paz no recanto mágico em que se recolhem todas as mágoas, se acanham as dificuldades, se desintegram as tristezas – e não porque ignoradas, mas por se indexarem, também elas, à transcendência que o livre oxigênio nos faz respirar.

E eu, que não vi a lua cheia, me fantasiei de estrelas – o refúgio tão necessário.

Comentários (0)

Os comentários estão fechados.