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 10nov 

Que pauta lhe interessa?

 

Por CRISTINA BRAGA, Revista Negócios da Comunicação
Assédio das agências de comunicação aos veículos precisa de critérios e novas maneiras de apresentar a informação

Houve época em que a única maneira de um assessor de imprensa abordar o jornalista que trabalha em redação era entregar o press release em mãos. A evolução técnica gerou a era do fax, com suas bobinas espirrando releases lentamente o tempo inteiro. Finalmente, novas tecnologias facilitaram ainda mais comunicação entre essas partes, e agora basta dar um click para o contato acontecer instantaneamente via e-mail. O lado ruim dessa história é que a facilidade se tornou um inconveniente por conta do excesso de informação enviada e pela insistência dos profissionais das assessorias de imprensa.
Hoje, algumas agências de comunicação já perceberam a importância de afinar a abordagem com o veículo, propondo um relacionamento condizente com a realidade em que vivemos. Redações cada vez mais enxutas, inundadas por e-mails não pertinentes ao seu foco de atuação, acompanhados por uma enxurrada de convites para viagens, almoços e encontros de todo tipo configuram um verdadeiro “assédio”. O tamanho das redações atuais não comporta o deslocamento de repórteres e editores para almoços e viagens a toda hora. Ocorre o paradoxo de o excesso de iniciativa comprometer as agências e seus profissionais num mercado altamente competitivo.
Como aproveitar melhor o link entre a fonte e a redação? Bia Bansen, sócia da Bansen Comunicação e Marketing, sediada em São Paulo e há 25 anos no mercado, diz que “os procedimentos para falar com a redação passam pelo bom senso e pela ponderação, como fazer releases mais enxutos e não entupir a caixa postal de ninguém com anexos pesados. Mais informações sobre o assunto da nota disponibilizo no site da agência”, revela. Entretanto, segundo ela, essa não é a pior parte. “O que pesa não é o volume de releases e notas, mas sim a má qualidade da informação”, garante.
Janine Saponara, diretora-presidente da Lead Comunicação Organi-zacional, agência pioneira no atendimento de contas do terceiro setor em São Paulo, diz acreditar que as agências de comunicação já estão abordando as redações de uma maneira diferente. “Aliás, como em todo mercado, tem as que já estão na nova era da abordagem por conteúdo, como eu costumo chamar, e as que ainda estão na velha fase de emplacar pautas por simples insistência e contatos pessoais. Estas não são referência”, aponta Janine.
Ela faz parte do Images and Voices and Hope, um movimento internacional de comunicadores, fundado nos Estados Unidos pela produtora de tevê    Judy Rogers, que, segundo Janine, “se cansou de ver notícia ruim e decidiu conclamar comunicadores no mundo inteiro para, através da ‘Metodologia da Investigação Apreciativa’, serem agentes de uma mídia que constrói”. Janine é certificada nessa metodologia pela Case University, de Cleveland, Ohio, nos Estados Unidos.
“Participar disto me fez ver que, se assessorias e redações não quebrarem o paradigma de pensar que uma tem de pedir e outra aceitar, não conseguiremos enxergar a verdadeira realidade que se descortina aos nossos olhos diariamente: o nosso grande papel de transformar o mundo no século XXI. E não é com um balcão de compra-e-venda no meio que isso vai acontecer”, diz Janine.
A diretora-presidente da Lead relata que, na relação do dia-a-dia com as redações, sua empresa questiona o jornalista “sobre o que ele tem feito com o poder que detém. Se ele recusa uma sugestão de pauta, logo perguntamos então qual é a que lhe interessa. E esta investigação é feita de forma muito apreciativa, não é simplesmente para emplacar a notícia do cliente”. Segundo Janine, ela se fundamenta no fato de que, sabendo o que aquele jornalista do outro lado linha quer e precisa, a agência tem muito mais condições de estabelecer um relacionamento produtivo com ele.
Pablo Pereira, editor-executivo de O Estado de S. Paulo, considera que as assessorias mudaram suas abordagens nos últimos anos. “Hoje, há maior especialização nesse segmento, com profissionais  preocupados com a divulgação dos seus clientes nas diversas mídias. Isso nos leva a conviver com algumas práticas novas na relação jornalista/fonte”. Ele cita como exemplo um tipo de “assédio” que se torna cada dia mais presente: “é aquele assessor que escreve textos curtos, para nota de coluna, mandadas para as redações na esperança que sejam publicadas na íntegra, às vezes até com o número de linhas certinho”. Muita informação já chega à redação com o requinte de um pretenso texto final, caso determinado jornalista não queira ter o trabalho de apurar e escrever as próprias reportagens, segundo Pereira.

Não há mágica.

Ele diz que as agências cumprem seu papel, defendem os interesses de sua clientela, fazem circular suas informações, legitimamente, mas observa que nem sempre esses interesses convergem com a pauta das redações. “As informações das agências de comunicação são relevantes, mas o jornalista que ficar a reboque delas não prestará bom serviço ao seu leitor. É preciso trabalhar, checar, cruzar informações, apurar detalhes, ter seu próprio olhar crítico sobre aquilo que será publicado, tanto no conteúdo quanto na forma. É trabalho duro. Não há mágica nem moleza”, afirma.
A revista Veja, da Editora Abril, não é receptiva às agências. Julio Cesar de Barros, um dos editores da revista, diz que a publicação não divulga notícia que vem de assessoria. Segundo ele, as agências falham ao colocar seu material “na mão de estagiários ou iniciantes que não têm muita influência sobre o veículo. Já  as assessorias segmentadas conseguem ter profissionais mais qualificados, que direcionam a informação para o editor certo”. Ele conta que, às vezes, as agências sugerem personagens interessantes, “mas só paro para ler se a sugestão é exclusiva. Quando é mandada ‘por atacado’, é difícil prestar atenção a qualquer mensagem vinda das agências”, afirma.
Para o ex-diretor de redação de O Estado de S. Paulo, Sandro Vaia, “a maioria dos pedidos que eu recebia para almoçar com clientes das assessorias interessava mais a esses clientes do que ao jornal. A abordagem continua sendo, na maioria das vezes, inconveniente e pouco acrescenta às necessidades do jornal de produzir material de interesse público e de boa qualidade”, diz ele.
Vaia diz que “o assédio é tão grande e às vezes tão despropositado que a redação corre o risco de deixar escapar, no meio de tantas mensagens, alguma coisa que seja importante, perdida numa montanha de inutilidades”. Diante da questão de que uma redação com poucos repórteres na rua depende das agências para criar e desenvolver suas pautas, a resposta dele é não. “A redação se pauta por aquilo que julga ser o interesse dos leitores e não o interesse das agências de comunicação”, sentencia.
Na contramão desse assédio, alguns repórteres se aproveitam da situação e exploram seus colegas das agências pedindo que façam seu trabalho, freqüentemente para localizar fontes adequadas para a pauta que têm a cumprir e às vezes até mesmo para desenvolver toda a apuração, acusam, em absoluto off, alguns desses explorados.

A revolução do e-mail

Carlos Henrique Carvalho, secretário-executivo da Associação Brasileira das Agências de Comunicação (Abracom), afirma “cada salto tecnológico, como agora, com o e-mail, abre a possibilidade de maior número de pessoas mandarem informações para as redações. Elas recebem cada vez mais notas das assessorias de imprensa e mensagens dos leitores, ouvintes e telespectadores, que também enviam perguntas. O volume de informações é muito grande”. O número de agências hoje estabelecidas no Brasil já alcança 1,1 mil, sendo que 600 estão no Estado de São Paulo, e cerca de 400 encontram-se na capital do Estado, segundo dados da Abracom, que incluem as agências domésticas (pessoas jurídicas que trabalham em casa).
Segundo José Luiz Schiavoni, presidente da Abracom e sócio-diretor da S2 Comunicação Integrada, a preocupação com o excesso de atividade por parte das agências dominou um seminário sobre relações com a imprensa realizado pela entidade em 2005. “Reunimos alguns editores e âncoras dos principais veículos do país e ficou claro que há uma necessidade de reduzir a distribuição de e-mails, e isto já é uma tendência. As práticas mais avançadas do nosso mercado abominam o envio indiscriminado de releases.”
Os participantes do seminário apontaram as assessorias de imprensa como importantes, mas disseram que o setor precisa ser mais organizado, ter ferramentas de distribuição mais focadas, critérios para enviar releases, e novas maneiras para apresentar a informação. Por exemplo, diz Schiavoni, às vezes vem escrito “informação importante” no campo ‘assunto’ do e-mail” e aí o jornalista nem abre porque ele recebe isso mil vezes por dia. Ele também recomenda nunca definir a mensagem como sendo de “alta prioridade”.
“O que a gente sente é que as redações precisam dessa informação, elas não dispensam o trabalho das agências, pelo contrário, uma informação bem organizada é importante para o jornalista porque a fonte nem vai chegar até ele se não passar  pela assessoria. Tem muito jornalista que vai direto ao presidente da empresa, que o remete à assessoria”, emenda o secretário da entidade, Carlos Henrique Carvalho.
Por sua vez, o presidente da Abracom, José Luiz Schiavoni, afirma que há mesmo uma relação de interdependência. As agências e assessorias das empresas organizam informações, facilitam o trabalho do jornalista. Mas não podem interferir jamais na independência editorial. “As novas tecnologias e o dinamismo de um mercado globalizado fizeram com que o volume de informações disponível crescesse de forma significativa”, diz, e o trabalho das agências e dos assessores de comunicação deve servir para “garantir o fluxo de informação disciplinada e com credibilidade”.

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